A sua infância difícil marcou-o profundamente, com o trabalho árduo praticado pelos pais e irmãos mais velhos (Mykyta e Katrusia), fome, condições de vida muito precárias, próprias da qualidade de servos, quase escravos. A tal ponto que a sua irmã mais nova, Mariyka, ficou cega por subnutrição.
Todas estas dificuldades, bem como a brutalidade e opressão vivida pelo povo ucraniano, juntamente com as histórias sobre os heróis da Ucrânia e o folclore da sua terra, contadas pelo avô paterno, Ivan, serviram de base para o crescimento intelectual do jovem Tarás. Em 1822 começa a sua aprendizagem sob os rigores de vários diáconos que, para além de o ensinarem a ler, escrever e desenhar, maltratavam-no e batiam-lhe.
Fica órfão de mãe aos 9 anos de idade e, 2 anos depois, perde o pai, mantendo-se sob os cuidados da sua madrasta. Mas por pouco tempo. Em 1828, Paul Engelhardt e a sua casa (incluindo os seus servos) mudam-se para Vilnius, na Lituânia. Nesse mesmo ano começa a trabalhar para o seu dono como criado pessoal de casa, pois Paul Engelhardt não autoriza a continuação da sua aprendizagem nas letras e nas artes. Proíbe-o de desenhar, embora Shevchenko o fizesse longe dos olhares do seu senhor.
Finalmente, P. Engelhardt concorda em mandá-lo estudar pintura com Jan Rustem, na Universidade de Vilnius.
Mas em 1831, devido a levantamentos revolucionários na Lituânia e também na Polónia, acabam por mudar-se para S. Petersburgo, onde P. Engelhardt permite ao jovem Tarás ser aprendiz de um dos maiores pintores à época, Valeri Shyrayev, o que durou cerca de 4 anos. Esta oportunidade permitiu-lhe aprender várias técnicas, que colocava em prática, nos seus longos passeios, quando tinha tempo livre, desenhando pelos jardins de Verão de S. Petersburgo.
Foi num destes passeios, em Julho de 1835, que o grande artista Ivan Shoshenko reparou nos seus trabalhos. Cedo ficaram amigos e companheiros ideológicos: I. Shoshenko apresenta-lhe a grande elite cultural da cidade, para além de ensinar-lhe outras técnicas de desenho e pintura. Dessa elite poderemos destacar nomes muito importantes como o grande artista russo Karl Bryulov, o poeta Zhukovsky (que havia sido tutor da família do czar), ou o escritor ucraniano Yevhen Hrebinka. Ao reconhecerem o grande talento artístico do jovem Tarás Shevchenko, conseguiram, através de um retrato de Zhukovsky pintado por Bryulov, arrecadar em leilão os 2500 rublos necessários para comprar a liberdade de Shevchenko, o que acabou por acontecer a 22 de Abril de 1838. Assim, começa por frequentar as aulas do seu amigo e protector Bryulov na Academia de Artes, tendo obtido por duas vezes a medalha de prata com as suas pinturas. Nesta fase aproxima-se da literatura universal, tendo conhecimento mais profundo das obras de Shakespeare, Walter Scott, Dickens, Goethe, Homero, Schiller, Pushkin, Gogol (que gostava particularmente), entre outros. Desenvolve a crítica realista em pintura, desenho, ilustração e retrato, procurando temas do seu interesse social. Esses temas serão exactamente os mesmos que inspirarão a sua escrita.
Segundo a sua autobiografia, foi em 1837 que ele começou a escrever os primeiros versos, nos jardins de S. Petersburgo. E de tal forma isso o marcou que, em 1840, nasce a obra mais paradigmática da literatura ucraniana: Kobzar, a sua primeira colecção de versos, sobre a vida dos cossacos, o folclore ucraniano e a vida difícil do seu povo. Nesse livro deixa também transparecer o enorme amor e o grande lirismo que sente pela sua terra. Ora estas temáticas, às quais ressalta-se a sua crítica às péssimas condições em que viviam os ucranianos, muito devido ao rigor e à opressão do regime czarista, juntamente com a forma como Shevchenko ridicularizava a alta aristocracia russa, fez com que ele fosse perseguido.
Em 1843 volta à Ucrânia (Kirilivka), mas é na sua segunda visita, em 1845, a pedido da Comissão Arqueológica, já graduado pela Academia, que escreve o famoso poema “Zapovit” (Testamento). Este poema acabará por tornar-se quase um hino à nação ucraniana e voz activa contra a servidão. Neste espírito, junta-se ao movimento libertador “Sociedade Cirilo e Método”. Em 1846 trava conhecimento com Kostomarov, seu grande admirador, e um dos membros dessa sociedade cultural e política. É denunciado e preso a 5 de Abril de 1847 pela polícia czarista russa, mandado para o exílio e condenado a 25 anos de prisão em Orenburg, ficando proibido de escrever ou desenhar. O czar Nicolau I estava particularmente interessado em mantê-lo preso nessas condições, para evitar tumultos revolucionários. Mas, como no passado, ele continuou a trabalhar clandestinamente, escondendo na sua bota um bloco com os seus desenhos e poemas. No ano seguinte é convidado a seguir numa expedição ao mar Aral, devido às suas qualidades artísticas. Tem um pouco mais de liberdade nesta expedição, pois pode desenhar durante a viagem. Volta a ser preso, após confiscarem a sua poesia na cela de Orenburg. Fica sob vigilância mais restrita, no Forte de Novopetrovsk (hoje Forte Shevchenko), no Mar Cáspio, em 1850. Ele, no entanto, não desiste. Escreve nesta altura a sua biografia, sendo um dos seus testemunhos mais notáveis, onde deixa antever os pensamentos, convicções políticas, sentimentos, um íntimo e profundo conhecimento da condição humana, e do povo ucraniano em particular. Após a morte do czar e com a ajuda da intervenção dos seus amigos intelectuais, consegue ser libertado em 1857. A 2 de Agosto desse ano, sai da prisão em direcção a Nizhny Novgorod (hoje a cidade de Gorky). Aí escreve uma das suas mais emblemáticas obras, cheia de figuras de estilo, chamada “Os Neófitos”. Contudo, não lhe é permitida a entrada em S. Petersburgo; só a consegue no ano seguinte. Em 1859 dá-se a sua última visita à Ucrânia para ver os seus amigos e a família. É preso novamente, e levado para S. Petersburgo, por fazer discursos anti-governamentais e revolucionários contra o poder russo. Em Outubro de 1860, Tarás Shevchenko fica gravemente doente, devido às más condições de vida, acabando por falecer a 10 de Março de 1861, o mesmo ano em que é abolida a servidão. É sepultado no cemitério Smolensk, em S. Petersburgo, depois transladado para Kaniv, e finalmente, a 22 de Maio desse ano, é sepultado na colina de Chernecha, perto de Kaniv, junto ao rio Dniepre.
Com apenas 47 anos morre o pai da língua ucraniana, que lutou toda a sua vida, sob as condições mais difíceis, passando fome, maus tratos e miséria, para elevar o nacionalismo ucraniano e libertar o seu povo do jugo imperialista russo. Produziu mais de 1 000 obras de arte, sendo considerado um dos maiores pintores realistas do Leste. Por mais de 150 anos os seus escritos, em particular os seus poemas nacionalistas, foram traduzidos em todo o mundo. É considerado o fundador da literatura ucraniana e, com toda a certeza e merecimento, um dos escritores mais humanistas de todos os tempos.
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TESTAMENTO
Quando eu morrer, sepultem-me
numa colina
Em meio à estepe ampla,
na amada Ucrânia,
para que eu possa ver
Os vastos campos semeados,
O Dniepre, as escarpas
E ouvir como ruidoso, ele ruge!
Quando for levado da Ucrânia
Ao mar azul,
O sangue inimigo...eu tudo deixarei,
Campos, montes...
E até a Deus voarei para rezar.
Mas até então... a Deus desconheço!
Sepultem-me e levantem-se,
Quebrem as algemas
E com o mau sangue inimigo
Reguem a liberdade!
E não deixem de recordar-me
Na grande família,
Na família livre, nova,
Com uma boa,
Suave palavra!