De tempo a tempo, recebo da América Latina e em menor número da Europa as cartas dos “valentes” anónimos, que dizem que Ucrânia deve viver em paz com o seu grande vizinho do Norte, e que ucranianos e os ditos nortenhos são irmãos. O mais engraçado, que isso provem das pessoas que não fazem mínima ideia o que significa viver lado–a–lado com o tal Grande Irmão.
Olhar histórico
A cidade de Sebastopol é a base da frota russa do Mar Negro, uma das principais cidades da península da Crimeia, que historicamente pertence aos Tártaros. Os tártaros da Crimeia haviam fincado pé no norte e no centro da península desde o século XIII. Depois de 1478, eles reinaram como príncipes tributários do Império Otomano até 1783, quando toda a Crimeia foi anexada ao Império Russo. Já no século XX, em 1954, a Crimeia foi transferida por Khrushchov para a Ucrânia. Com o colapso da União Soviética em 1991, a Crimeia tornou-se parte da recém – independente Ucrânia, uma situação ressentida por parte da população russa e causadora de tensões entre a Rússia e a Ucrânia. Em resultado do acordo entre a Rússia e Ucrânia, a frota russa do Mar negro poderá permanecer no território ucraniano até 2017. Em 2008, a Rússia celebrava 225º aniversário da sua frota militar, data não vista com bons olhos pelos patriotas da Ucrânia. Para aquecer as coisas, a secreta ucraniana, SBU, proibiu a entrada no território ucraniano, ao perfeito de Moscovo, Yuri Luzhkov, pelas declarações anti – ucranianas, que atentam sobre a soberania nacional do Estado Ucraniano.
Para celebrar 90º aniversário do Hastear a Bandeira Ucraniana na Frota do Mar Negro em 1918 (durante a vigência da República Popular Ucraniana), a foto – jornalista Olena Bilozerska, visitou a cidade de Sebastopol na semana passada. Proponho – vós a sua reportagem, que mais parece uma incursão militar no campo do inimigo.
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Saímos no período da tarde do dia 10 de Maio: pessoal da UNA – UNSO (organizadores), algumas pessoas do Partido Ucraniano, grupo “Tryzub” e simpatizantes sem filiação partidária, juntos cerca de 50 pessoas.
Durante o percurso era vigente a “lei seca”, ninguém podia beber, até pediam para não cantar muito, tudo bastante sério. Às 23h00 em ponto, no número do telemóvel (que os organizadores tornaram público), começaram entrar centenas de chamadas e SMS, geralmente da Rússia com ameaças. Acção inimiga era coordenada à partir de um fórum na Internet. Simplesmente desligamos o celular e passamos usar outros. O que pretendiam eles? Amedrontar nós? Ou simplesmente descarregar o celular? J
O pessoal pró – russo (no fórum) discutia a maneira mais vil de receber os ucranianos e como os bater! Citação:
“Os banderistas (ucranianos da Galiza), serão transportados pelos americanos via marítima. Temos que capturar e interrogar um dos banderistas, mas melhor capturar o seu coordenador local”. Na verdade, no nosso grupo apenas duas pessoas eram da Galiza...
Chegada à Sebastopol
Não gostei ver a grande quantidade das bandeiras tricolores russas nos edifícios. Mas gostei imenso os billboards, com as palavras do Presidente Ucraniano Victor Yushchenko “9 de Maio – Glória aos heróis!”. Vimos muitos destes pelo caminho, mas não esperava vê-los no Sebastopol, foi positivamente surpreendida.
Depois de algumas reuniões e recolha da informação no local, decidimos fazer piquete do estado – maior russo da frota do Mar Negro. Tínhamos os dísticos: “Frota russa, leva casaco, hora de ir para casa!”, “Luzhkov não convidado pior que Zatulin” (deputado da Duma, outro inimigo confesso da Ucrânia), “Sebastopol e Crimeia = Ucrânia”, entre outros.
Nosso líder disse: temos que aguentar-se pelo menos 5 (!) minutos, depois seremos atacados e presos. A situação não era nós favorável: a rua onde fica o estado – maior russo não era reivindicado por nós para fazer piquete, nossa acção era quase ilegal. Mas pelo menos era o local, onde ninguém esperava por nós.
Antes da acção, algumas pessoas recusaram-se participar nela. Sabendo que eles não são medricas, só posso entender isso assim: eles não queriam arriscar-se pela ideia, quando alguma pessoa sem ideias nenhumas, ia receber todos os louros da acção. Eu própria achei que não vou pensar nisso, qualquer ideia correcta é abocanhada pelos aproveitadores. Será que melhor é não fazer nada?
Chagamos no local. Eu tirei várias fotografias do estado maior, dos “tricolores – activistas russos”, dos militares, que deveriam conter o piquete. Depois o nosso líder deu o sinal e piquete começou: nós abrimos bandeiras com a cruz da UNA – UNSO, os “tricolores” atacaram-nos com gritos “Fascistas, desaparecem para a Hoverla”, polícia começou separar os grupos, havia luta corpo–a–corpo em todos os lados.
Polícia encostou-nos à um camião, eu fiquei no meio duma luta séria, alguém queria tirar a minha câmara, eu não entregava, tudo como sempre. Foi salva pelo Ihor M., gritando “Essa é nossa!”, ele me puxou com força através do cordão policial para o nosso grupo.
Um tipo com goela bem cheia, ameaçava o nosso líder que “vai abate-lo”, gritava que é um deputado. Algumas fitas tricolores foram usadas para limpar sapatos. Subi o camião para fotografar melhor e neste momento as forças “tricolores” começaram disparar contra nós, usando armas pneumáticas, eles acertaram nos meus velhos, mas queridos óculos...
Forças anti – ucranianas gritavam: “Ucranianos, fora da cidade russa!”, “Fascistas”, “Sebastopol, Crimeia, Rússia!” e simplesmente “Rússia, Rússia”. E claro, as palavrões, sem eles não pode ser... Também atiravam os ovos, geralmente acertavam nos jornalistas e na polícia, pretendiam atacar-nos fisicamente, polícia teve dificuldade de conte-los.
Ucranianos gritavam: “Glória à Ucrânia!”, “Sebastopol – Ucrânia”, houve tempo, quando gritos “Uc-râ-ni-a!” conseguiram calar a “Rússia”. Companheiro Parafuso foi único que consegui abrir o seu dístico sobre Luzhkov e aguentou-se o tempo todo, depois conseguiu furar o cerco e junto com o seu dístico chegou a base. Outro grupo de ucranianos que não foi cercado, conseguiu levantar bem alto a grande bandeira da Ucrânia.
Onze ucranianos foram temporariamente presos e levados para a esquadra mais próxima. Tínhamos a ordem, no caso de prisão de alguns, os restantes juntam-se ao autocarro e saem para Kyiv. Mas eu decidi ficar, tinha medo do que o pessoal podia ser preso em Sebastopol até um período de 15 dias. Elementos “tricolores” chegaram à esquadra, davam entrevistas às televisões, queixavam-se que em todo o Sebastopol existe apenas uma única escola da Rússia. “Escola de língua russa?”, - perguntei eu, sem acreditar neles. “Não é escola russa, escola da Rússia, que ensina pela programação da Rússia. Somos russos, apenas estamos sob a ocupação (da Ucrânia), queremos que os nossos filhos estudem pela programação russa. Não vamos conseguir viver convosco (com a Ucrânia), seremos salvos só pela separação”.
Mas nossos foram rapidamente libertos e fomos para casa. Em resultado: capturamos três bandeiras do inimigo; Luzhkov já não vai visitar o Sebastopol (SBU lhe proibiu entrar na Ucrânia); a nossa acção foi demonstrada pelos cinco canais da TV, como eles explicam as nossas motivações, não nós interessa, conseguimos mostrar que existimos e temos a nossa voz.
Eles (moradores de Sebastopol), são russos e querem ficar com a Rússia. Eles podem ter a razão deles, que não nós interessa. Pois a sua razão não é compatível com os interesses nacionais da Ucrânia. Ponto final.
Vídeo:
http://www.vesti.ru/videos?vid=131663
http://news.ntv.ru/itogi/131981
http://5.ua/newsline/230/0/50567
http://ifolder.ru/6523376
Meus fotos estão aqui:
http://bilozerska.io.com.ua/album118078
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